A hora de despertar o turismo local em Angola!

Artigo publicado originalmente no Jornal Expansão, edição de 24 de Setembro de 2021

Não é novidade que a Covid-19 quebrou a economia mundial, afetou o mercado petrolífero, piorou a crise que a nossa economia já atravessava e disparou outro severo golpe ao kwanza, desvalorizando-o ainda mais e tornando o nosso custo de vida agonizante. Com esta realidade, todos tivemos que gerir cortes no orçamento doméstico e com certeza as necessidades menos básicas, do topo da pirâmide e associadas as satisfações dos nossos prazeres, tiveram que ser reduzidas, substituídas ou até excluídas.

É nestes momentos, que o cinto aperta, que as famílias devem encontrar soluções criativas para manter alguns destes prazeres e ao mesmo tempo controlar o orçamento. Viajar é com certeza um desses pequenos prazeres para muitos, mas por outro lado um grande peso para qualquer orçamento. É sempre bom conhecer novos locais, novas pessoas, nova gastronomia, novas culturas e fazer um “reset” do nosso meio, mas neste momento, viajar para o exterior do país se tornou um luxo ainda maior!

Além de todo o incomodo relacionado com a gestão da Covid-19, o preço de um bilhete de avião para um adulto está a rondar 1 milhão de kwanzas, dependendo do destino. Se pensarmos em uma família de 4 pessoas, que para uma viagem internacional precisa de reservar no mínimo entre 2 a 3 milhões de kwanzas apenas para os bilhetes de passagem, sem contar com os gastos adicionais com estadia, alimentação e passeios, chegamos a conclusão que viajar para o exterior neste momento não é para qualquer um! Por essa razão, olhar para o interior do país passou a ser uma solução muito mais prática e viável.

As famílias que querem tirar alguns dias de férias, descansar e fugir da rotina, podem fazer umas espetaculares férias locais e gastar apenas uma fracção do que estaria destinado aos bilhetes de passagem para o exterior. A questão a ser feita é o que falta para que isso aconteça? Agora que a cerca sanitária já foi levantada para a Província de Luanda, por que não exploramos o nosso país?

Para os empresários do sector, as notícias demonstram que o turismo é um dos que mais sofreu à custa da pandemia com alguns operadores a apontarem uma redução em torno de 80% nas suas atividades. Mas como todas as crises, caso seja bem aproveitada, esta pode ser transformada numa excelente oportunidade de desenvolvimento. Com criatividade, podemos e devemos desenvolver o turismo nacional, mas este esforço deve ser conjunto e envolver operadores, governo e nós mesmos como consumidores. Que impacto teria o turismo local para os pequenos agricultores, para os artesãos a beira da estrada, no desenvolvimento das economias das províncias e no emprego?

Os empresários também precisam de começar a vender Angola como um destino de férias, viagens de fim de curso, lua de mel, aventura, entre tantas outras possibilidades, não é tudo apenas culpa do governo. Primeiro vender para nós angolanos, pois muitos até podem ter possibilidades para pequenos escapes, mas nunca viajaram pelo país, seja porque não sabem como fazê-lo ou porque não são incentivados para tal. Depois, vender Angola aos angolanos que estão na diáspora com saudades da sua terra natal, aos estrangeiros residentes ou não, que têm uma curiosidade sobre África começando com uma abordagem de dentro para fora. Dessa forma, grande parte do dinheiro reservado para férias das famílias que têm condições financeiras, ficará no país e irá contribuir para a criação e manutenção de empregos e crescimento da economia.

E porque não também promover uma indústria de serviços e atividades a volta dos locais turísticos, com excursões para os pontos de interesse da províncias de forma a tirar uma maior rentabilidade de cada visitante. Devem melhorar a qualidade dos produtos, serviços e atendimento. Investir mais na formação do pessoal, criar pacotes para os diferentes bolsos, ajustados a nossa realidade. Soluções simples como parques de campismo, apartamentos familiares, cabanas de praia ou de campo. Têm que mostrar as pessoas que é possível ter uma experiência fantástica pelo país a preços económicos.

Na terceira parte desta tríade, junto com as famílias e os operadores turísticos, temos o governo que para impulsionar um turismo rentável e de qualidade deve apostar na criação e melhoria de infraestruturas como estradas, energia elétrica, água e saneamento básico. A melhoria da qualidade e manutenção das estradas nacionais é fundamental para o turismo local, pois viajar por estrada ainda é a forma mais económica de andar pelo país. Não se justifica que para deslocar-se entre províncias seja necessário passar por verdadeiras crateras lunares que danificam as viaturas resultando assim num aumento dos custos, tempo de viagem e desmotivação pelo turismo local. 


Podem também ser implementados programas de incentivos fiscais para os operadores, que poderão garantir mais condições de empregabilidade tornando o governo num verdadeiro parceiro ao desenvolvimento do turismo e não um obstáculo. O governo pode ainda efetuar estudos sobre as razões que afastam os turistas nacionais e internacionais do nosso país e buscar soluções para os seus desafios. Namíbia, Africa do Sul e Cabo-Verde podem ser ótimos parceiros com os quais podemos ter protocolos de cooperação já que têm no turismo uma parcela significativa do seu PIB.

Apenas com as medidas apresentadas, o governo irá contribuir para a redução dos custos de operação das empresas do sector, tornando-o mais atrativo e incentivando o turismo local com viagens acessíveis para os turistas.

Por último, comunicar melhor o nosso país é urgente! A nossa angolanidade, os pratos típicos, danças, povos, cultura e o nosso clima tropical maravilhoso. Os turistas vão ao Egipto ver o deserto, as pirâmides, a esfinge, vão as Maldivas para mergulharem em águas cristalinas e fazer a praia.

Cada país vende o que tem de melhor, vende a sua cultura, vende a sua natureza, vende a sua originalidade. Vamos apresentar ao país e ao mundo as nossas potencialidades turísticas, o deserto do Namibe (o mais antigo do mundo), a Welwicthia (a planta eterna, que pode chegar aos 2 mil anos), as praias, as cascatas de encher os olhos, o mufete, o hoje já internacional kuduro, a kizomba, o semba, as lendas a volta dos nossos povos e as historias dos nossos sobas, os Mumuilas, os Mucabais. As opções são inúmeras! Nós temos apenas que escolher, saber embalar o produto e colocar num lugar de destaque na prateleira do turismo local e mundial. Existe muito potencial turístico em Angola, mas falar não é suficiente, temos que partir para a ação!


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